31 de julho de 2018

Aprender Com Os Erros












Aconteceu comigo no início da carreira. Trabalhava numa das maiores agências do Rio de Janeiro. Fazia parte de um grupo de contas que lidava com uma das contas mais importante da agência. Melhor dizendo: era a maior conta da agência.

Meu momento de carreira era promissor. Trabalhando numa agência de peso, tinha a oportunidade de estar ao lado de profissionais incríveis e muito respeitados no mercado. Não era apenas questão de construir uma network interessante, mas uma baita oportunidade de aprender com gente grande. Já era hora de dar um upgrade de função, passando de assistente a coordenadora. Se continuasse a mostrar serviço e a aprender como se fazia, e a fazer bem feito, não demoraria a ser promovida, pensei.

Foi aí que o cliente nos passou a missão de criar uma campanha de reposicionamento de um de seus produtos. Uma tarefa difícil, mas que fora meticulosamente planejada e criada. A diretora de contas do meu grupo trabalhou duro desde o início acompanhando e liderando todo o processo. Eu ficava na retaguarda, complementando seu trabalho, realizando as tarefas mais táticas, cuidando de alguma burocracia.

No dia anterior à apresentação tudo estava pronto e nossa reunião com o cliente seria logo no primeiro horário do dia seguinte. E aqui residiu a raiz do problema: como eu era assistente da conta, procurei me ater mais ao dia a dia dos trabalhos em andamento do que a essa importante apresentação. Confiando que a responsabilidade pela apresentação não estava em minhas mãos, deixei a coisa fluir e não me envolvi mais profundamente no assunto. Estava tudo ensaiado pela diretora da conta. O diretor da agência tomou conhecimento dos detalhes principais. E eu acreditava que as coisas iriam fluir como combinado: a diretora apresentava, o diretor da conta ficava ali para dar peso e importância, dando seus pitacos aqui e ali. E eu anotando tudo pra fazer a ata e o acompanhamento dos desdobramentos.

No dia da apresentação, cheguei à hora combinada. O diretor da agência também. Mas a diretora da conta estava atrasada, pois um engarrafamento provocado por um atropelamento impedia o trânsito de fluir. O cliente chegou e estava ansioso para saber o que havíamos preparado. Pedimos que esperasse uns quinze minutos na esperança de que a diretora da conta chegasse. Ele esperou por mais de meia hora e tivemos que iniciar sem ela. Ela nos ligou para informar que, do jeito que a situação estava, não conseguiria mesmo chegar a tempo.

O que fazer senão conduzir a apresentação sem ela? Muito óbvio quando se tem o domínio do assunto. Mas o diretor não sabia detalhes. E eu não tinha conhecimento do todo por não ter seguido de perto o trabalho mais importante daquele momento.

Obviamente, mesmo que tivesse conhecimento mais amplo do assunto, eu, como assistente da conta, não seria a pessoa mais indicada para conduzir a apresentação, porém isso não deveria impedir que eu  apoiasse a diretoria da agência no que fosse necessário. Como não estava preparada nem em termos de conhecimento, muito menos emocionalmente, gelei e acabei não fazendo nada para ajudar. Emudeci, fiquei invisível. E em nada contribuí.

O resto da história você pode imaginar. O cliente, além de se aborrecer pelo atraso, provavelmente saiu da apresentação com a impressão de que o grupo que o atendia não estava comprometido com a conta. Acabou questionando várias coisas e foi difícil depois costurar todas as ideias e salvar a campanha.

Analisando essa história em perspectiva, claro que dou um desconto pela minha falta de senioridade. E, sim, minha diretora teve um papel muito importante ao discutir comigo esses pontos de maneira construtiva para que eu pudesse melhorar a partir dali. E assim vivermos felizes no trabalho por mais algum tempo, até mudarmos de agência. Poderia ter sido pior.

O importante é que aprendi logo cedo que, mesmo que eu não tivesse experiência, deveria estar mais envolvida. Mesmo sendo hierarquicamente menos “importante”, eu era parte de uma equipe.

Mesmo a atitude da pessoa menos “importante” pode influenciar na reputação da equipe como um todo. E, consequentemente, no sucesso da relação agência-cliente.

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17 de julho de 2018

O Que Acontece Quando Eu Faço Besteira?




Artigo extraído do blog Adventures in Client Service, de Robert Solomon, autor de The Art of Client Service, John Wiley & Sons (2016).

Esta história começa de forma bem inocente.

Fiz uma recomendação de uma mala-direta para um cliente que incluía uma estimativa de custos aproximada e uma quantidade projetada de envios. Cheguei a essa estimativa usando um conjunto de suposições lógicas baseadas em meus (mais do que eu gostaria de admitir) anos de experiência, e achei que estava seguro com esse número.

Meu cliente gostou do que apresentei e nos deu a aprovação para prosseguirmos. Escrevi um brief, confirmei os prazos e me reuni com o pessoal da criação. Após idas e vindas com o redator, o diretor de arte, e o diretor de criação, chegamos a algumas ideias das quais gostamos. Levamos, então, ao cliente. Após umas outras idas e vindas, chegamos a um plano que nos agradou a todos. Daí especifiquei detalhadamente aquela ideia e mandei o job para orçar.

Os números chegaram. Estávamos acima do budget. Não por 10 por cento, ou mesmo 20 por cento, o que talvez desse para eu defender. Não, conforme fui somando os custos foi ficando claro que estávamos acima por mais do que o dobro do que eu havia estimado anteriormente.

Não se tratavam de horas-homem que a gente poderia absorver, o que já seria ruim o suficiente; eram custos de terceiros. Foi ótimo as janelas não abrirem, porque eu talvez estivesse propenso a me jogar.

Na verdade, levantar vôo não era uma opção; eu precisava de outra solução. Pensei em revisar ou eliminar algumas das peças do pacote, mas no final das contas ficou claro que somente uma coisa poderia verdadeiramente ter impacto no custo: cortar a quantidade do mailing.

Pedi à gráfica para reorçar o pacote em 50% do originalmente proposto. Para meu alívio perpétuo, os números ficaram próximos ao objetivo. Embora o mailing final fosse a metade da estimativa inicial, ainda assim seria maior e mais ambicioso do que qualquer outra coisa que o cliente tivesse realizado anteriormente. Pelo menos era algo positivo no meio daquilo que poderia ter se tornado uma terrível realidade.

Agora, tudo o que eu teria que fazer era vender isso ao cliente, mas havia um fator complicador: eu tinha uma viagem agendada para fora da cidade na semana seguinte e não poderia falar com ele cara a cara. Sem problemas, pensei; vou escrever um email para ele.

Preparei uma análise longa, meticulosamente detalhada, do problema, descrevi as várias soluções que explorei, e então apresentei uma solução. Antes de apertar “enviar” eu quis uma outra opinião, então mandei o documento por email para que um colega comentasse. Ele respondeu: “Você não pode mandar esse email. Esse problema é muito sério, a solução é muito complicada para ser enviada por email. É necessária uma discussão ‘ao vivo’ ”.

Ele estava certo, claro. Era como se ele tivesse lido o meu livro e eu não. Pensei nisso por um minuto, e decidi reagendar aquela reunião fora da cidade. Então liguei para meu cliente e marquei uma reunião na segunda-feira.

Na segunda-feira coloquei-o a par de toda a situação: a origem do problema, as soluções possíveis, e a recomendação. Admito que me encolhi quando ele disse: “Você está realmente o dobro do budget?

Como isso foi possível?” Mas sem reclamações extras, nenhum insulto, e para seu crédito eterno, ele focou no problema. Ele foi amplamente responsável por termos chegado a algo satisfatório. Não foi uma reunião alegre, mas fizemos o que tinha de ser feito.

Agora eu poderia dizer que esse desfecho teria sido bem diferente caso eu não conhecesse bem esse cliente e não tivesse desenvolvido uma certa medida de confiança e respeito mútuo ao longo do caminho. Mas não é isso o que eu vou dizer.

Estou nesse negócio há mais de 30 anos e já deveria saber certas coisas, entretanto ainda me acontece de fazer besteiras das grandes. A lição? Nunca presuma nada, e nunca, jamais, seja tão simplista ou tão displicente como eu fui a respeito de dinheiro. Confira e re-confira seus pedidos, e depois confira de novo. Sobretudo, lembre-se de seu próprio conselho: não faça besteiras a repeito de dinheiro ou de tempo*.

E, por Deus, certifique-se de que o seguirá.
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(*) O autor refere-se ao que escreveu no capítulo do seu livro The Art of Client Service, intitulado What Happens When I Screw-up? (O Que Acontece Quando Faço Besteira?).

10 de julho de 2018

O Atendimento Deve Ser Eliminado?



Em março desse ano, a Campaign publicou reportagens repercutindo as declarações do Chief Brand Officer da P&G Marc Pritchard em palestras proferidas por ele em Londres e nos EUA.

O que rendeu pano pra manga foi o fato de que Pritchard se disse incomodado com a estrutura das agências, no que ele definiu ser um excesso de gerenciamento, restando pouco espaço para a criatividade. Isso acabou virando uma “treta” na qual o Atendimento virou o centro da crítica. De repente, ao ler as matérias, parecia que o recado do executivo teve apenas um direcionamento: “o pessoal do Atendimento não acrescenta nada ao resultado criativo” e deve ser limado da relação.
Muita calma nessa hora
Li as matérias publicadas (aqui e aqui) e assisti a uma das palestras do Pritchard disponível na web.

Creio que o que Pritchard disse foi mais amplo, e respinga em muitas outras coisas. O papel do Atendimento é um pequenino ponto disso tudo.

Pritchard conclamou os anunciantes a tomar as rédeas do seu processo de trabalho com as agências e reinventar o modelo de parceria entre ambos. Desfazer os abismos entre marca (o cliente), criação (a agência) e consumidor. Focar no que realmente interessa – a criatividade – para ganhar agilidade.

Sua proposta é que, nesse novo arranjo, tudo o que não acrescentar ao resultado criativo deva ser evitado, até eliminado. Na sua opinião, existe um excesso de processos e burocracia nas agências. Ele se ressente por estar pagando por uma estrutura que emperra em vez de agilizar. Dá como exemplo as incontáveis reuniões com um monte de profissionais da agência (planejadores, atendimento, gerentes de projeto etc.). E felizmente faz um mea culpa assumindo a responsabilidade pelo número igualmente expressivo de representantes da parte do cliente (sem poder de decisão), o que provocaria esse efeito que ele chama de “buddy system”: se o cliente tem 10 pessoas cuidando do marketing, a agência se sente na obrigação de ter 10 profissionais para atendê-los.

É bom ressaltar que, além da redução de camadas “inúteis”, ele propõe também que mídia e criação trabalhem em conjunto (pra quem não sabe, o modelo de lá não é como o nosso, os birôs de mídia são empresas separadas das agências). Ele considera que tudo isso eliminaria o obstáculo à criatividade e traria a agilidade que a comunicação exige hoje em dia. Além, é claro, dele ter, como cliente, participação mais ativa e lado a lado com a agência.

O que veio depois
Num painel realizado em evento posterior às palestras de Marc Pritchard, provavelmente como reação ao que a mídia repercutiu, o executivo-chefe do McDonald’s Paul Pomroy fez questão de se posicionar de forma mais cautelosa. Defendeu as agências e os gestores de conta, colocando-os como pessoas-chave na tradução do negócio do cliente para os criativos. Pontuou que muitas vezes não são as agências que erram, mas sim os maus clientes que fornecem briefings errados.

Na mesma semana, o então diretor executivo do grupo WPP Martin Sorrell declarou em entrevista que já estava implantando times menos burocráticos e mais criativos para trabalhar com a Unilever. Disse ele: “(…) 75% do tempo investido deve ser em torno do produto criativo, em detrimento de ser estratégico, da gestão da conta ou de qualquer outra coisa”.  Viu só? Sorrell não menciona só gestão de conta (atendimento), mas estratégia (planejamento) e “qualquer outra coisa” (portanto, qualquer outro profissional que seja percebido pelo cliente como mais uma camada não relevante para o processo criativo). Revelou que estava, assim, respondendo ao pedido do seu cliente Unilever, que alinhou-se à mesma proposta sugerida pela P&G, e buscou redefinir a relação com a agência.

O que podemos aprender com isso
Embora a P&G seja o maior anunciante do mundo e possa influenciar decisões em cadeia, são as demandas dos diferentes clientes que acabam por determinar de que forma qualquer agência vai trabalhar.

Há contas que demandam um arranjo onde a agilidade deve estar no foco e muitos processos – e custos, claro – podem ser eliminados. Já outras… Quem já trabalhou com contas públicas (prefeituras, governos) sabe bem o nível de burocracia envolvido para cumprir com todos os protocolos e sabe quanto tempo é necessário para que cada decisão seja tomada no cliente. Nesses casos, há muito tempo dispensado na parte gerencial e comparativamente menos na estratégia criativa. Empresas anunciantes muito hierarquizadas também levam as agências a implantar estruturas com muito foco nos processos gerenciais.

Outro ponto: ninguém aqui discute que criação é o core business das agências. Mas também sabemos que a criatividade não se restringe ao departamento de criação. Ainda mais nos dias de hoje, onde as barreiras entre as disciplinas vem caindo consideravelmente. Portanto, se você tem algo a acrescentar ao resultado criativo, seja você Atendimento ou não, certamente o cliente não vai se importar com o nome do seu cargo.
Afinal, esse papo nem é novo
Tudo o que foi proposto por Marc Pritchard agora é reflexo de outras questões bem mais complexas que vêm acontecendo na nossa indústria desde o advento do digital, e que ainda vão dar muito pano pra manga. Mais uma vez, repito: as tais “camadas de intermediação” que retiram a criatividade do protagonismo vão muito além do trabalho de um gestor de contas (se quiser saber mais, leia este artigo de Pyr Marcondes no Meio & Mensagem, escrito há mais de um ano).

Mais uma coisa: metodologias ágeis também têm estado em pauta há alguns anos. Eu mesma escrevi um artigo contando sobre um desses métodos usados na RG/A com um de seus clientes e que, já em 2014, propunha, até mesmo, a eliminação do brief.

Voltando ao fio da meada, o que se pode extrair da proposta da P&G é que o momento é de reinvenção. Nas palavras de Pritchard: “reinvenção da mídia, reinvenção da propaganda e reinvenção da parceria cliente-agência”.

No caso da parceria, ele propõe que agência e cliente repensem seu modelo para trabalhar colaborativamente. Anunciantes devem trabalhar com as agências e não através das agências, diz ele.

À propósito, no final da palestra que assisti ele deixa uma provocação para todos nós:
"Se você trabalha numa agência, o que poderia parar de fazer que não agrega valor ao resultado criativo? E o que poderia começar a fazer para criar valores verdadeiramente únicos para seus clientes?"
Acho que é o que a gente deveria pensar desde sempre, concorda?
Bom levar uma sacudida de vez em quando para que a gente não se perca.

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3 de julho de 2018

Não à Linguagem Sexista na Publicidade

A pergunta é: você toparia fazer um pequeno esforço para acabar com grandes equívocos?
A gente às vezes não percebe e acaba assumindo verdades sem questionar, não é mesmo? Inclusive na linguagem que usa, na maneira de explicar as coisas, de se referir às pessoas e às situações mais corriqueiras. Isso acontece na escola, no trabalho, na vida em geral. Vamos falando, escrevendo, até produzindo campanhas sem nos darmos conta de que estamos cometendo injustiças, reforçando estereótipos, prejudicando pessoas.

O bom da história é que não precisa ser assim. Na verdade, nem é complicado virar essa chave. Basta apenas querer.

Quer saber como começar? A planejadora Gabriela Rodrigues preparou o manual Linguagem Não Sexista na Publicidade para nos ajudar nessa. Se você dedicar uns minutinhos do seu tempo para conhecer esse material, vai ver exemplos de como o preconceito está nos pequenos detalhes da nossa linguagem cotidiana. E vai aprender como evitá-lo. “O material existe para isso, para mostrar que o erro também ocorre no dia a dia, em escalas menores que, muitas vezes, são justificadas como brincadeira, costume ou até mesmo culpa da língua portuguesa”, segundo Gabriela. (leia a entrevista completa da Adnews)
 



Mudar um hábito, no começo, requer mais atenção, mais cuidado. Com o tempo, torna-se exatamente isso: um hábito. Novo. Nesse caso, melhor pra todo mundo.